Resumo: A partir da bibliografia existente, não é difícil notar que atores como Carl Friedrich Philipp von Martius foram decisivos para constituição do que chamamos de uma langue e uma imagem da mestiçagem no Brasil, a partir das quais fora forjado um imaginário de que a especificidade da “civilização brasileira” seria fundada na mestiçagem de três raças. Argumentamos que Gilberto Freyre teve um papel de destaque na atualização e propagação desta langue ao argumentar que esta originalidade civilizacional se alicerçaria na mestiçagem e em um equilíbrio de antagonismos, construindo, deste modo, um esquema mental notavelmente conservador. Isso, porém, não impediu que essa matriz intelectual tenha sido revisitada, sistematicamente, em formas de pensamento encontradas em movimentos culturais e intelectuais críticos. Casos notáveis nesse sentido são: a antropofagia, o tropicalismo e alguns estudos pós-coloniais. À vista disto, o nosso trabalho tem as seguintes intenções: (i) expor as principais linhas do pensamento freyriano a respeito de uma civilização tropical miscigenada e (ii) escandir os usos que foram feitos deste imaginário e diagnóstico de Freyre pelos movimentos acima expostos, enfatizando algumas experiências intelectuais. Concluímos que, apesar de práticas desconstrutivas, a metonímia entre mestiçagem e construção de uma identidade nacional apaziguada é dominante.
Abstract: It is easy to note from the existing bibliography that actors such as Carl Friedrich Philipp von Martius were decisive in the constitution of what we call a langue and an image of miscegenation in Brazil. The idea that “Brazilian civilization” was exceptional was founded on an imaginary revolving around the miscegenation of three races. We argue that Gilberto Freyre played a prominent role in updating and disseminating this language by arguing that Brazil’s civilizational originality was based on miscegenation and a balance among antagonisms. In doing so, Freyre built a remarkably conservative mindset. This did not, however, prevent a systematic revisitation of this intellectual framework by critical cultural and intellectual movements. Notable cases in this regard are: anthropophagy, tropicalism and some postcolonial studies. This study explores these movements: (i) to expose the main lines of Freyre’s thought about a supposedly mixed-race tropical civilization and (ii) to reveal the uses that were made of this imaginary and of Freyre’s diagnosis by the above-mentioned movements. We conclude that, despite deconstructive practices, the metonymy between miscegenation and the construction of an appeased national identity is dominant.