Uma das principais justificativas da proposta de mudanças do Código Florestal brasileiro (CF) é a de que seu cumprimento supostamente inviabilizaria vários setores da agropecuária, apesar dessa justificativa ser fracamente sustentada em dados. O objetivo desse trabalho foi avaliar as implicações do cumprimento do CF para a redução de áreas de produção canavieira no Estado de São Paulo, visando estimar qual seria o limite superior de potenciais prejuízos que a aplicação do CF poderia trazer à viabilidade econômica de um dos mais importantes, e também impactantes ambientalmente, segmentos da produção agropecuária brasileira. Foram analisados 23 projetos de adequação ambiental conduzidos em 1.961 propriedades rurais de usinas sucroalcooleira do Estado de São Paulo, os quais totalizaram 533.097 ha (9,7% da área cultivada com cana-de-açúcar em São Paulo). Nesses projetos, realizaram-se um diagnóstico ambiental de Áreas de Preservação Permanente (APP), áreas de produção agrícola e de áreas potenciais para constituir a Reserva Legal. Os resultados indicaram que 10,4% da área total das propriedades rurais constituiriam APPs e que apenas 21,2% da área de APP (2,2% da área total) era utilizada por algum tipo de atividade agrícola, sendo que cana-de-açúcar ocupava apenas 12,1% da área enquadrada como APP pelo atual Código (1,2% da área total). Em média, 76,5% da área total dos projetos estavam ocupadas por cana-de-açúcar e a soma das áreas potencias para a averbação da Reserva Legal, constituídas de remanescentes florestais (5,0% da área total), áreas abandonadas (2,3% da área total) e de áreas com outros usos (6,3% da área total), resultaria em 13,6% da área total, gerando um déficit médio de 6,4% de áreas para o total cumprimento da Reserva Legal (20%). Esse déficit poderia, por lei, inclusive ser compensado fora da matrícula, em paisagens de menor aptidão agrícola. Assim, o diagnóstico apresentado nesse trabalho para o setor canavieiro no Estado de São Paulo aponta que o CF vigente poderia ser cumprido sem inviabilizar a produção agrícola, ressaltando que parte dos argumentos favoráveis às alterações no CF precisa ser revista à luz de dados concretos e de forma menos especulativa.
One of the major reasons of the proposed changes of the Brazilian Forest Code is that its compliance would supposedly harm several agricultural sectors, although this reason has been weakly supported by data. The goal of this work was to evaluate the implication of the compliance with the Forest Code for reducing areas of sugarcane production in the State of São Paulo, aiming to estimate the upper limit of potential losses that the application of the Forest Code could bring to the economic viability of important sectors of Brazilian agricultural production. We analyzed 23 projects of environmental planning carried out in 1,961 landholdings of sugarcane mills from São Paulo State, which totalized 533,097 ha (9.7% of the cultivated area with sugarcane in the state). In these projects, we carried out an environmental zoning of Permanent Protected Areas (PPA), lands of agricultural production, and potential lands to constitute Legal Reserves. The results indicated that, on average, 10.4% of the total area of each farm was classified as PPA, and that only 21.2% of PPA area (2.2% of the total area) were occupied by some kind of agricultural production. Sugarcane occupied, in average, 12.1% of the areas classified as PPA (1.2% of the total area). Overall, 76.5% of the total area of projects was occupied by sugarcane fields and the sum of potential areas for compliance with the Legal Reserve, which were constituted by forest remnants (5.0% of total area), abandoned lands (2.3% of total area), and lands with other uses (6.3% of total area), would result in 13.6% of the total area and consequently generate a deficit of 6.4% of lands for the full compliance with the Legal Reserve (20%). This deficit could even be compensated, by law, outside the landholding register in landscapes with lower agriculture suitability. Therefore, the diagnostics presented in this work for the sugarcane sector in the State of São Paulo indicates that compliance with the current Forest Code would not reduce agricultural production, which highlight that part of the arguments that are favorable for changes in the Forest Code need to be revisited in the light of concrete data and in a less speculative way.